Por que valorizar o artesanato tradicional em suas viagens?
Viajar por Santa Catarina é descobrir muito mais do que belas paisagens e gastronomia saborosa. O estado também abriga um rico patrimônio imaterial preservado pelas mãos de artesãos que mantêm vivos saberes antigos, transmitidos de geração em geração. O artesanato tradicional vai além da estética: ele carrega a memória de um povo, seus modos de vida, sua relação com o território e suas crenças.
Explorar esse universo é mergulhar em uma história feita à mão, onde cada peça conta um capítulo da identidade cultural catarinense. Para o turista atento, cada cidade pode revelar um ofício que resiste ao tempo: uma renda feita no tear manual, uma peça entalhada em madeira, uma cerâmica moldada com barro retirado da própria terra. E, muitas vezes, é possível não só adquirir esses objetos, mas também vivenciar o processo de criação em oficinas abertas e conversas com os mestres da tradição.
Artesanato como expressão da identidade cultural de um povo
O fazer artesanal é uma linguagem. A técnica, os materiais e os símbolos usados revelam muito sobre o território onde surgiram. Em Santa Catarina, é possível identificar a presença dos povos indígenas, das comunidades açorianas, alemãs, italianas, polonesas e africanas em cada detalhe do artesanato local. Esses objetos não são apenas utilitários ou decorativos: são registros vivos da diversidade cultural catarinense.
A importância da preservação de técnicas ancestrais
Com o avanço da industrialização, muitos saberes manuais quase desapareceram. Manter viva uma técnica ancestral — como a renda de bilro, a cestaria de taquara ou o bordado de linha fina — é resistir ao apagamento cultural. Ao visitar comunidades que preservam essas práticas, o turista fortalece esse elo e contribui diretamente para a continuidade desses ofícios.
Turismo de experiência: conhecer histórias vivas através das mãos
A visita a uma oficina de artesanato tradicional é um tipo especial de turismo. Diferente de ver um objeto em uma prateleira, a experiência de conversar com quem o criou, observar o processo e até tentar reproduzir algum gesto transforma a viagem. O valor do objeto transcende o material e passa a ser afetivo, simbólico e educativo.
Como reconhecer uma tradição artesanal centenária
Técnicas que atravessam gerações e resistem à industrialização
Uma tradição artesanal centenária é marcada pela continuidade. Mesmo com adaptações ao longo do tempo, os fundamentos técnicos permanecem os mesmos. A madeira entalhada com ferramentas manuais, a renda feita em bilros de madeira, o barro modelado com as mãos: esses gestos repetidos por décadas ou séculos revelam uma linhagem cultural.
Comunidades onde o fazer artesanal está ligado à memória coletiva
Em várias cidades catarinenses, o artesanato não é apenas uma atividade econômica: é uma prática coletiva, feita em grupo, ligada a festas religiosas, ciclos agrícolas ou rituais de passagem. O trabalho artesanal é parte do cotidiano e da organização da vida comunitária. Nessas localidades, é comum encontrar escolas livres de saberes, grupos de mulheres artesãs e oficinas abertas ao público.
Selo de origem, feiras locais e oficinas como evidências vivas
Algumas técnicas artesanais em Santa Catarina possuem reconhecimento formal, como selos de procedência ou inclusão em inventários de patrimônio cultural imaterial. Além disso, feiras regionais e eventos de artesanato são boas oportunidades para encontrar mestres artesãos, comprar peças com procedência garantida e conhecer projetos de valorização cultural.
Roteiro cultural por cidades de Santa Catarina com saberes preservados
Florianópolis – Rendas de bilro e cerâmica açoriana
As rendeiras da Lagoa da Conceição e do Ribeirão da Ilha
A capital catarinense é um dos principais redutos de tradições açorianas no Brasil. Entre elas, destaca-se a renda de bilro, feita por mulheres que manipulam com destreza dezenas de bilros sobre almofadas circulares, criando tramas delicadas e geométricas. Na Lagoa da Conceição e no Ribeirão da Ilha, ainda é possível encontrar oficinas abertas, onde rendeiras mais velhas ensinam as mais jovens e produzem peças únicas.
Oficinas vivas e visita a ateliês tradicionais
Além das rendeiras, Florianópolis abriga ceramistas que seguem a tradição do barro moldado com as mãos e queimado em forno a lenha. A visita ao Ateliê de Cerâmica do Ribeirão ou a projetos culturais como o “Caminho das Rendeiras” é uma imersão sensível e educativa nas práticas que fundaram a cultura manezinha.
São João Batista – Sapateiros e calçados artesanais
Cidades do couro e da costura manual
Localizada no Vale do Rio Tijucas, São João Batista é conhecida como a “capital catarinense do calçado”. Antes da chegada da indústria, a produção de sapatos era artesanal, feita por sapateiros que dominavam o corte do couro, a costura e o acabamento manual. Hoje, ainda existem pequenas oficinas familiares que mantêm esse saber, produzindo calçados sob medida e modelos exclusivos.
Pequenas fábricas familiares e a tradição do sapato feito à mão
Algumas dessas oficinas abrem suas portas para visitantes interessados no processo. É possível conhecer os moldes, as ferramentas tradicionais e acompanhar o processo de montagem de um par de sapatos, do couro cru ao acabamento final. Para quem valoriza o feito à mão, esse é um destino imperdível.
São Bento do Sul – Marcenaria e móveis de madeira maciça
A herança germânica na fabricação artesanal de móveis
São Bento do Sul carrega no seu DNA a tradição dos marceneiros alemães que colonizaram o planalto norte catarinense. A produção de móveis de madeira maciça, com encaixes perfeitos e acabamento manual, é uma prática passada de pai para filho. Muitos móveis feitos há cem anos ainda estão em uso e servem de referência para novos artesãos.
Exposição de peças e visitas a oficinas de carpintaria tradicional
Na cidade, é possível visitar o Museu Municipal e conhecer oficinas de artesãos que mantêm a tradição viva. Alguns trabalham com técnicas de marchetaria, torneamento e entalhe. A visita a essas oficinas revela o cuidado com cada peça e o respeito ao tempo do material.
Timbó – Tecelagem e bordado com raízes alemãs
Grupos de mulheres que mantêm viva a tradição do bordado manual
Timbó preserva saberes femininos que resistiram ao tempo. O bordado em linho, o crochê e a tecelagem artesanal são praticados por grupos de mulheres que se reúnem em associações comunitárias e compartilham seus conhecimentos com as novas gerações. Essas práticas estão ligadas à vida doméstica, aos enxovais e às festas familiares.
Museus comunitários e oficinas abertas ao público
O Museu da Música e o Museu do Imigrante oferecem visitas guiadas e oficinas sazonais. Em datas especiais, como festas típicas e feiras culturais, as bordadeiras expõem e vendem seus trabalhos, permitindo ao visitante levar para casa uma peça com valor simbólico e cultural.
Bombinhas – Cestarias e utensílios de taquara
Artesanato caiçara ligado à pesca e à vida litorânea
Em Bombinhas, a presença caiçara se expressa através das cestarias e utensílios feitos com taquara, cipó e folhas de palmeira. Esses objetos, como balaios, peneiras, armadilhas de pesca e cestos, são usados no dia a dia das comunidades tradicionais do litoral.
Feiras de artesanato e comunidades produtoras
O bairro de Zimbros abriga artesãos que mantêm essa tradição e participam de feiras organizadas pela comunidade. O visitante pode conhecer o processo de trançado, aprender sobre o uso das fibras naturais e adquirir peças diretamente dos produtores.
Como planejar uma viagem com foco em tradições artesanais
Roteiro por datas de festas, feiras e encontros culturais
Antes de viajar, é recomendável consultar o calendário cultural das cidades. Festas como a Festa do Divino em Florianópolis, a Marejada em Itajaí e o Festival de Culturas Populares em Blumenau são momentos ideais para encontrar artesãos reunidos, participar de oficinas e conhecer uma variedade de saberes em um único local.
Onde se hospedar para viver a rotina das comunidades
Optar por hospedagens familiares, pousadas rurais ou comunidades de base solidária pode enriquecer a experiência. Muitas vezes, os próprios anfitriões são artesãos ou indicam oficinas próximas. Dormir e acordar no ritmo do lugar permite uma imersão mais profunda na cultura local.
Cuidados ao comprar: como apoiar o artesão de forma justa
Dar preferência a peças feitas manualmente por artesãos locais, evitar intermediários e valorizar o tempo de trabalho investido são formas de apoiar de maneira ética. Perguntar sobre a história da peça e o nome de quem a fez também reforça o vínculo humano e o reconhecimento.
Quando o destino é feito à mão
Há algo de profundamente transformador em visitar lugares onde o tempo corre no ritmo das mãos. Um bordado que leva dias, uma renda que exige concentração silenciosa, uma peça de madeira talhada aos poucos — tudo isso nos ensina a desacelerar e a observar. Santa Catarina, com sua diversidade cultural e força comunitária, oferece ao viajante atento um mapa diferente: o das rotas traçadas pela paciência, pela delicadeza e pela permanência dos gestos.
Seguir esse roteiro é mais do que turismo. É um encontro com o Brasil profundo, com as raízes que ainda resistem nas dobras do litoral, nos vales, nos planaltos e nos quintais. E ao levar consigo uma peça artesanal, o viajante carrega mais do que um objeto: leva consigo um pedaço vivo da história, moldado não por máquinas, mas por memórias, afetos e identidade.